Por mais que Brasília já tenha visto de tudo no caminho entre fé e poder, o episódio do último sábado (25/10) um tipo de constrangimento raro. O ex-governador José Roberto Arruda foi barrado, vaiado e expulso de um evento da Convenção Geral da Assembleia de Deus de Brasília (Adeb), em Taguatinga.
A cena, registrada em vídeo e rapidamente viralizada nas redes sociais , mostra o político tentando forçar a entrada em um encontro reservado a pastores e reagindo com empurrões e ameaças ao ser impedido.
O argumento inicial de Arruda era singelo: queria “receber uma oração”. Mas bastaram poucos minutos para o gesto se transformar em espetáculo. Quando um dos organizadores explicou que o evento era restrito a líderes credenciados, o ex-governador perdeu a calma. Empurrou um presbítero, ignorou as regras do local .
O vídeo, amplamente divulgado, exibe uma mistura de constrangimento e perplexidade. De um lado, líderes religiosos tentando conter o tumulto. De outro, um político visivelmente irritado, incapaz de lidar com o próprio ostracismo. Arruda, que tenta reconstruir sua imagem após os escândalos da Operação Caixa de Pandora e anos de inelegibilidade, parece ter acreditado que poderia se reerguer também pela via da fé .
Mas o que se viu em Taguatinga foi o oposto da redenção. O episódio revelou que parte do eleitorado e do meio evangélico, já não aceita ser palco para projetos pessoais disfarçados de devoção.
A convenção era um encontro interno da igreja, com pautas teológicas e administrativas, e não um comício informal. Ao tentar transformar o púlpito em palanque, Arruda acabou lembrando ao público justamente o que mais tenta apagar: a velha política movida pelo impulso, pelo descontrole e pela sede de visibilidade.
Só que, no caso do ex-governador, a equação desandou. Faltou sensibilidade, sobrou cálculo. E o resultado foi a rejeição explícita uma recusa pública .
O gesto, ainda que pequeno, diz muito sobre o momento político de Brasília. A capital vive um novo ciclo, em que o pragmatismo do púlpito cede espaço à preservação da imagem institucional das igrejas. O recado é claro: não é qualquer político que se redime só por citar Deus no discurso.
E, como bem sabe quem acompanha o tabuleiro político local, Brasília não perdoa quem confunde fé com marketing. No altar da opinião pública, a imagem do ex-governador foi novamente sacrificada , não por adversários, nem por delatores, mas pelos próprios pastores que, desta vez, se recusaram a abrir as portas do templo.
Talvez aí esteja o símbolo mais eloquente da cena: Arruda bateu à porta da igreja buscando aceitação, mas encontrou o eco das portas que a política, não parece disposta a reabrir.




